A infestação
"Não
temos que lutar somente
contra
a carne e o sangue, mas sim
contra
os principados e as potestades,
contra
os dominadores deste mundo de
trevas,
contra os espíritos malignos
espalhados
pelos ares.. "
(Ef
6, 10-11)
A TERMINOLOGIA a respeito da ação extraordinária do
demônio sobre os homens, as coisas e os locais, não é uniforme: alguns autores
falam em obsessão, para designar essa atuação demônio, quer se trate de sua
simples presença local, quer de atuação sobre o homem, mas sem possuí-lo, quer
da possessão. Adotamos aqui a terminologia utilizada por Mons. Corrado
Balducci, por parecer-nos simples e direta: infestação local,
infestação pessoal e possessão diabólica. (Cf Mons. C. BALDIJCcI, Gli
indemoniati, p. 3; El diablo, pp. 156-158.)
Trataremos em primeiro lugar das duas formas de
infestação — a local e a pessoal; no capítulo seguinte, da possessão.
Infestação
local
A infestação local consiste em uma atividade
perturbara que o demônio exerce diretamente sobre a natureza inanimada (reino
mineral, elementos atmosféricos, etc.) e animada inferior (reino vegetal e
reino animal), e também sobre lugares, procurando desse modo atingir
indiretamente o homem, sempre em modo maléfico. Com efeito, todas as criaturas,
mesmo as irracionais, por maldição do pecado, ficaram sob o poder do demônio
(cf. Rom 8, 21ss). Assim, os lugares e as coisas, do mesmo modo que as pessoas,
estão sujeitas à infestação demoníaca. E preciso não esquecer a atuação dos
demônios dos ares, a respeito das quais nos adverte o Apóstolo: “Não temos que
lutar somente contra a carne e o sangue, mas sim contra os principados e as
potestades, contra os dominadores deste mundo de trevas, contra os espíritos
malignos espalhados pelos ares...” (Ef 6, 10-11).
Entram nessa categoria as casas e lugares
infestados: objetos que voam ou se deslocam de lugar, sons estranhos ou
perturbadores (passos, pedradas nas vidraças ou no telhado, uivos, gritos,
gargalhadas); impressão de presenças invisíveis, sensação de perigos
inexistentes, etc.; distúrbios visíveis, estranhos e repentinos que se
verificam no mundo vegetal e no mundo animal (árvores ou plantações que secam
repentinamente, doenças desconhecidas nos animais, pragas, etc.).
Certos fenômenos ou calamidades de aparência e
estruturas naturais (tempestades, terremotos e outros cataclismos, incêndios,
desastres, etc.) podem ter igualmente o demônio como autor, senão único direto
(como na possessão), ao menos parcial e dirigente. Por exemplo, o raio que caiu
do céu e consumiu os pastores e as ovelhas de Jó, do mesmo modo que o vento do
deserto que fez cair a casa dos filhos do Patriarca, esmagando-os sob as
ruínas, foram suscitados por Satanás (Jó 2, 16-19). Nesse caso, podem ser
incluídos essas manifestações demoníacas extraordinárias. Muitas vezes, tais
manifestações ocorrem em concomitância com casos de infestação pessoal ou de
possessão diabólica.
Infestação
pessoal (obsessão)
A infestação pessoal é uma perturbação que o demônio
exerce, já não mais sobre o mundo material e as criaturas irracionais, mas
sobre uma pessoa, diretamente, sem contudo impedir-lhe o uso da inteligência e
da livre vontade. Apesar de ser excepcional, é talvez o mais freqüente dos três
tipos de atividade maléfica extraordinária - isto é, infestação local,
infestação pessoal, possessão. Como a infestação local, a pessoal também
comporta graus de intensidade, e diversa modalidade.
A infestação pessoal pode ser externa ou física e
interna ou psicológica, conforme se exerça sobre os sentidos externos ou
internos e sobre as paixões do homem. Com freqüência, a infestação é
simultaneamente externa e interna.
Na infestação externa ou física, demônio age sobre
nossos sentidos externos: a vista, provocando aparições sedutoras ou,
contrário, apavorantes; a audição, fazendo ouvir rumores, palavras ou canções
obscenas, blasfêmias, convites, agrados ou ameaças; o tacto, com sensações
provocantes, abraços, movimentos carnais; então dores, doenças, etc. Mas o
demônio pode atuar também sobre os sentidos internos (fantasia e memória) e
sobre as paixões. A infestação interna ou psicológica consiste em sugestões
violentas e tenazes: idéias fixas, imagens expressivas e absorventes,
movimentos profundos de emotividade e de paixão - por exemplo, desgostos,
amargura, ressentimentos, ódio, angústias, desespero; ou, ao contrário,
inclinação para algum objeto ilícito, ou inclinação, de si lícita, mas
desregrada quanto ao modo e à intensidade. Comenta o Pe. Tanquerey: “A pessoa
se sente, embora com desgosto, invadida por fantasias importunas, tediosas, que
persistem não obstante os esforços vigorosos para afastá-las; ou então por
frêmitos de ira, angústia, desespero, ímpetos instintivos de antipatia; ou pelo
contrário, por perigosas ternuras sem razão alguma que as justifiquem” .
(Adolphe TANQUEREY, Precis de Théotogie Ascétique ei Mystique. p. 958.)
Os acessos de melancolia e os transportes de furor
que afligiam Saul, por obra de um demônio e por permissão divina ( cf. 1 Reis
16, 14-23), são característicos da infestação pessoal interna, infestação
psicológica. Diferentemente do possesso, o infestado guarda a disposição de
seus atos exteriores, embora em muitos casos tenha sua liberdade diminuída. Ele
conserva o poder de reagir contra as sugestões do interior (por exemplo,
sugestões de blasfêmias), de julgar sobre o valor moral destas sugestões, achando-as
abomináveis. Uma das modalidades de infestação pessoal, talvez das mais
freqüentes são as doenças, muitas vezes desconhecidas e incuráveis, que chegam
a levar à morte, se Deus o permitir. É o que, aliás, lemos no livro de Já:
“Disse, pois, o Senhor a Satanás: Eis que ele (Jó) está na tua mão; conserva,
porém, a sua vida” (Jó 2, 6). As escrituras apresentam vários casos de tais
enfermidades de origem de diabólica. Exemplo clássico, é a lepra que cobre de
chagas o justo Jó, da planta dos pés até o alto da cabeça (Jó 2, 7-8). Seriam
igualmente vítimas de infestação diabólica a mulher encurvada, atormentada pelo
demônio havia dezoito anos, de tal sorte que não se podia endireitar, e que foi
curada por Nosso Senhor (Luc 13, 11); o menino epilético (Mt 17, 14; Mc 9, 17;
Luc 9, 38); o mudo (Mt 9,32); e o cego mudo (Mt 12, 22).
Mons. Balduecci se refere a doenças de origem
demoníaca, por efeito de malefícios, observando que nestes casos os distúrbios
são com freqüência de ordem física, sendo dificilmente diagnosticados pelos
médicos; outras vezes se trata de inconvenientes que atacam a vida psíquica, a
própria personalidade do indivíduo, tomando-o difícil, raivoso e até incapaz de
atuar no âmbito de sua vida familiar e social. (Cf. Mons. C.BALDUCCI, El diablo,
p. 184.) Convém precisar que muitas das manifestações acima descritas, embora
próprias às infestações locais ou pessoais, não são exclusivas delas e nem
sempre são de origem demoníaca; várias anomalias de ordem psíquica (ilusões,
alucinações, delírios) podem se externar pelos mesmos fenômenos; um cuidadoso
exame do indivíduo e das circunstâncias que acompanham os fatos poderá revelar
a origem natural patológica ou demoníaca dos distúrbios.
Vítimas
prediletas da infestação
Se bem que qualquer pessoa possa ser vítima desse
tipo de tormento diabólico, Mons. Balducci indica três categorias de pessoas
que estariam mais sujeitas a ele: os santos, os exorcistas e demonólogos, e os
maleficiados (vítimas de malefício). Os santos, por causa do ódio que o demônio
tem daqueles que de modo especial amam a Deus e procuram a perfeição; isto, do
lado da intenção do demônio; do lado da permissão divina, esta é dada como
provação especial a almas muito eleitas. Vários santos a experimentaram. Entre
os antigos, basta lembrar Santo Antão; do mesmo modo Santa Catarina de Siena
(1347-1380); São Francisco Xavier (1506-1552); Santa Teresa de Jesus
(1515-1582); Santa Maria Madalena de Pazzi (1566-1607); São João Batista
Vianney, o Cura d’Ars (1786-1859) São João Bosco (1815-1888); Santa Gemma
Galgani (1878-1903)*.
Os exorcistas e demonólogos: a razão é tão óbvia que
quase não é preciso dá-la; os primeiros, com seu ministério, fazem diminuir a
presença do demônio no mundo e libertam suas vítimas; os segundos, com seus
estudos, esclarecem os fiéis com relação à existência e atividade demoníacas.
Os maleficiados (vítimas de malefício), por
permissão de Deus, para seu castigo, ou provação, ou para manifestar o poder
divino. (Cf. Mons. C. BALDUCCI, El diablo, p. 179.)
* Esta Santa leiga, grande mística, recebeu os
estigmas da Paixão, tinha freqüentes visões de Nosso Senhor e de Nossa Senhora,
e um comércio quase contínuo com seu Anjo da Guarda. Foi muito atormentada
pelo demônio que a espancava com uma vara durante horas e horas, às
vezes a noite inteira, causando-lhe profundas esquimozes no corpo, que duravam
vários dias, até que Nosso Senhor as curasse. Perseguia-a por toda a parte, em
casa, na rua, na igreja, com aparições, assumindo o aspecto de um cachorro, de
um gato, de um macaco, de pessoas conhecidas, ou de homens ferozes e
espantosos. Várias vezes um desses homens horríveis a jogou na lama quando saia
de casa para ir comungar. O demônio lhe aparecia também sob a figura de seu
confessor, Mons. Volpi e outras debaixo da aparência do Anjo da Guarda,
chegando a confundi-la; de certa feita o Maligno assumiu a figura de Jesus
flagelado, com o coração aberto e todo ensangüentado, para pedir-lhe maiores
penitências, com a dupla finalidade de fazer deteriorar sua já delicada saúde e
incitá-la a desobedecer o confessor que as havia proibido (Mons. C. BALDUCCI,
El diablo PP. 179-181).
(Fonte:
internet. Autoria:“Anjos e Demônios - A Luta Contra o Poder das Trevas”,
Gustavo Antônio Solímeo - Luiz Sérgio Solímeo)
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