José interpreta os sonhos do Faraó
José interpreta os sonhos do Faraó
Dois anos depois, o faraó teve um sonho. Parecia-lhe
que estava na margem do rio, do qual saíam sete vacas, muito formosas e gordas,
as quais pastavam nos lugares palustres. Saíam também outras sete do rio,
desfiguradas e consumidas de magreza, as quais pastavam na mesma margem do rio,
em lugares cheios de erva; e estas devoraram aquelas que eram belas de aspecto
e gordas de corpo. Tendo o faraó despertado, adormeceu novamente, e teve outro
sonho: Sete espigas saíam do mesmo caule, cheias de grãos e formosas; nasciam
também outras tantas espigas delgadas e queimadas do suão, as quais devoravam
todas as primeiras que eram tão belas. Despertando o faraó do sono, e tendo
amanhecido, cheio de pavor, mandou chamar todos os adivinhos do Egito, e todos
os sábios; e, estando reunidos, contou-lhes o sonho e não havia quem lho
explicasse.
Gênese, 40, 1-23
José interpreta os sonhos do Faraó
Então,
finalmente, lembrando-se o copeiro-mor de José, disse: Confesso a minha falta:
Tendo-se o rei irado contra os seus servos, mandou que eu e o padeiro-mor
fossemos lançados no cárcere do general do exército; aí uma noite, ambos nós
tivemos um sonho que pressagiava o futuro. Achava-se lá um jovem hebreu, servo
do mesmo general do exército; e, tendo-lhe nós referido os sonhos, ouvimos tudo
o que depois os fatos comprovaram; porque eu fui restituído ao meu ofício, e o
outro foi pendurado em uma forca. Imediatamente José foi tirado do cárcere por
mandado do rei; barbearam-no, mudaram-lhe os vestidos, e apresentaram-lho. E
este disse-lhe: Tive uns sonhos, e não há quem os interprete; ouvi dizer que tu
sabes explicá-los sapientissimamente. José respondeu: Não eu, mas Deus
responderá favoravelmente ao faraó. O faraó, pois, contou o que tinha visto:
Parecia-me estar sobre a margem do rio, e que saíam do rio sete vacas, em
extremo formosas, e muito gordas, as quais pastavam a erva verde nos lugares
palustres. E eis que, atrás destas, vinham outras sete vacas tão disformes e
magras, que nunca as vi semelhantes na terra do Egito; as quais, devoradas e
consumidas as primeiras, não deram nenhum sinal de ficar fartas; mas ficaram
tão macilentas e feias como dantes. Acordei, fui novamente oprimido pelo sono,
e tive este sonho: Sete espigas saíam do mesmo caule, cheias e formosas. Outras
sete, delgadas e queimadas do suão, nasciam doutro caule, as quais devoraram as
primeiras, que eram tão belas. Referi aos adivinhos o sonho, e não há quem o
explique. José respondeu: O sonho do rei reduz-se a um só: Deus mostrou ao
faraó o que está para fazer.
As sete vacas formosas e as sete espigas cheias são
sete anos de abundância; e no sonho têm a mesma significação. As sete vacas magras
e macilentas, que subiram (do rio) após as primeiras, e as sete espigas
delgadas e queimadas do suão são sete anos de fome que estão para vir. Isto
cumprir-se-á por esta ordem. Eis que virão sete anos de grande fertilidade por
toda a terra do Egito; depois dos quais seguirão outros sete anos de tanta
esterilidade, que será esquecida toda a abundância passada; porque, a fome há
de consumir toda a terra, e a grandeza da penúria há de absorver a grandeza da
abundância. Quanto ao segundo sonho que tiveste, que se refere à mesma coisa, é
um sinal certo de que se há de executar a palavra de Deus, e prontamente se
cumprirá.
Agora, pois, escolha o rei um homem sábio e ativo, a
quem dê autoridade sobre a terra do Egito; este (homem) estabeleça
superintendentes por todas as províncias; e a quinta parte dos frutos nos sete
anos de fertilidade, que já estão para começar, seja recolhida nos celeiros; e
guarde-se todo o trigo debaixo do poder do faraó, e conserve-se nas cidades. E
tenha-se preparado para a futura fome dos sete anos, que há de oprimir o Egito;
assim o país não será consumido pela fome.
José nomeado superintendente do Egito
— Agradou o conselho ao faraó e a todos os seus
ministros; e disse-lhes: Poderemos nós encontrar um homem como este, que esteja
cheio do espírito de Deus? Disse, pois, a José: Visto que Deus te manifestou
tudo o que disseste, poderei eu encontrar alguém mais sábio e semelhante a ti?
Tu governarás a minha casa, e ao mando de tua voz obedecerá todo o povo; eu não
terei sobre ti outra precedência além do trono. O faraó disse mais a José: Eis
que te dou autoridade sobre toda a terra do Egito. Tirou o anel da sua mão, e
colocou-o na mão dele; vestiu-lhe um vestido de linho fino e pôs-lhe ao pescoço
um colar de ouro. E fê-lo subir para o seu segundo coche, clamando o pregoeiro
que todos se ajoelhassem diante dele, e soubessem que era o superintendente de
toda a terra do Egito. Disse também o rei a José: Eu sou o faraó; sem teu mando
ninguém moverá mão ou pé em toda a terra do Egito. Mudou-lhe o nome, e chamou-o
na língua egípcia Salvador do Mundo. Deu-lhe por mulher a Asenet, filha de
Putifar, sacerdote de On. Saiu, portanto, José a correr a terra do Egito.
Gênese, 41, 1-45
In “O livro dos sonhos” de Jorge Luis Borges
Sem comentários:
Enviar um comentário