Satanismo — magia — feitiçaria
ATÉ AQUI VIMOS a interferência espontânea do demônio
na vida dos homens, seja pela sua ação ordinária — a tentação, seja pela ação
extraordinária — infestação local e pessoal e possessão. Cabe agora
estudar a sua intervenção a convite do próprio homem: a magia ou feitiçaria, os
pactos satânicos, as práticas supersticiosas em geral. É certo que o homem, por
sua natureza, não tem nenhum poder sobre o demônio, não podendo, portanto,
obrigá-lo a atender às suas solicitações, nem a cumprir o que foi pactuado com
ele.
Porém, não é menos certo que o demônio — sempre à
espreita de uma ocasião para fazer mal aos homens e perdê-los - não deixaria
escapar a oportunidade única de atuar quando convidado por eles próprios.
Assim, se Deus o permitir, ele pode atender aos pedidos que lhe são feitos e obter,
para os homens que a ele recorrem, riquezas, poder político, satisfação de
paixões e ambições, e mesmo prejudicar outras pessoas. Em outros termos,
o homem não pode ser a causa da interferência do demônio, mas pode muito bem
ser a ocasião dessa interferência.
De modo que a magia, se entendida no sentido de arte
pela qual o homem adquire um poder sobre o demônio, não existe e é impossível;
se entendida, no entanto, como a arte de operar prodígios por obra do demônio,
a magia não só é possível teoricamente, mas existe e é largamente praticada,
desde as mais remotas eras até o dia de hoje.
É fora de dúvida que o malefício é teoricamente
possível. Ele não comporta o menor absurdo em si, nem da parte do
homem, nem da parte do demônio, nem da parte de Deus. Com efeito, o homem
animado de um ódio satânico e abusando da sua liberdade, pode praticar as ações
mais perversas, sem excetuar a de invocar e adjurar os espíritos infernais,
para que eles apliquem seus poderes maléficos sobre uma pessoa determinada, O
demônio, por sua vez, pode atormentar os homens das maneiras mais estranhas e
mais inexplicáveis, e ele encontrará aí sua própria satisfação; e nada impede
que ele faça depender sua intervenção do emprego de um ritualismo simbólico,
que seria uma manifestação concreta de culto ao demônio, da parte do homem,
coisa muito agradável a Satanás, sempre desejoso de macaquear a Deus. E Deus
pode permitir o malefício, nos seus desígnios de justiça, assim como permite os
casos de possessão.
O feiticeiro não desenvolve, no malefício, as suas
forças. A intervenção de Satanás é aí evidente e Deus a permite, como permite a
tentação, as infestações e mesmo as possessões. As provas dessa intervenção
demoníaca são tão abundantes nas Sagradas Escrituras e na História religiosa,
que a ninguém é legítimo duvidar dela. Quando se crê no demônio, no que os
Livros Sagrados e a História dizem dele, rejeitar essa possibilidade é
irracional. Na verdade, diante de testemunhos tão irrefutáveis, não se pode não
crer na existência de feiticeiros e na eficácia de seus feitiços, por obra do
demônio, sempre que Deus o permitir.
Capitulo 1
Da
superstição à adoração do demônio
“Os
que se apegam às superstições
enganosas
abandonam a graça
que
lhes era destinada".
(Jonas
2, 9, Vulg)
A
superstição
A superstição é um arremedo indigno do verdadeiro
culto a Deus, por depositar a confiança em fórmulas e ritos empregados para
forçar Deus a atender o que Lhe é pedido, e para desvendar o futuro. Chama-se
também superstição a veneração de caráter religiosos tributada a “forças” reais
ou imaginárias, em lugar de Deus. A superstição procura aprisionar o
sobrenatural mediante fórmulas ou ritos para pô-lo ao seu serviço. O
supersticioso quer servir-se da religião para proveito próprio e não para
cultuar desinteressadamente a Deus. Por isso Deus, através do Profeta Jonas,
adverte: "Os que se apegam às superstições enganosas abandonam a graça que
lhes era destinada” (Jn 2, 9).
O supersticioso põe uma confiança indevida em práticas
às quais nem Deus, nem a Igreja (por concessão divina), nem a natureza
conferiram o poder de obter certos efeitos.
Sempre que se procuram determinados efeitos por
meios desproporcionados, os quais de nenhum modo podem conduzir ao resultado
desejado, se confia na atuação de forças misteriosas, ao menos implicitamente,
para obter esse resultado. Como essas forças vêm de Deus nem de seus anjos, só
podem provir do espírito das trevas. E assim, a partir da superstição, se
chega, facilmente, ainda que de forma não inteiramente consciente, ao recurso
implícito ao demônio. Daí, para a invocação explícita, não há senão um passo.
Em suma, o desejo de subjugar as forças superiores e de as instrumentalizar
para proveito próprio, e dessa maneira chegar a "ser como deuses” (cf. Gen
3, 5), é o fundamento de toda a superstição, de toda a magia.
Pacto com
o demônio
Possibilidade
de pacto com o demônio
Sabemos pela Revelação que os homens podem entrar em
comunicação voluntária com os demônios e pedir que eles façam ou concedam
coisas que superam as forças humanas. Está fora de dúvida que o demônio
intervém espontaneamente, de um modo sensível, na vida dos homens; porque não
haveria ele de intervir diante da solicitação de uma vontade humana? Não há
nisto nada que seja contrário á ordem das coisas, nem da parte de Deus, nem do
demônio. Da parte de Deus, Ele pode permitir à ação do demônio como castigo
para o homem por causa de suas faltas,* ou como provação para a vítima, ou para
algum outro efeito que Ele conhece, nos Seus desígnios de sabedoria e justiça.
Do lado do demônio, está bem de acordo com a sua psicologia atender a uma
solicitação que tanto lisonjeia seu orgulho, gratifica seu ódio a Deus e do
homem, e satisfaz seu desejo de fazer o mal.
*É o que pensava santo Agostinho, o qual afirma que
os homens que se dedicam à superstição "são entregues, como suas vontades
más merecem, aos anjos prevaricadores, para serem escarnecidos e
enganados".
O homem pode entrar em relação com os anjos e com os
demônios, uma vez que uns e outros são seres inteligentes e livres. Nessa
condição, tanto o homem quanto os anjos e os demônios podem fazer uso de sua
liberdade e unir-se para a obtenção de um fim comum. Mas, para isso, é preciso
haver um ponto de contacto entre uns e outros; quer dizer, é preciso que uns e
outros tenham disposições análogas. Quando as relações são estabelecidas entre
seres de natureza diversa, é evidente que o ser de natureza superior impõe as
suas disposições ao inferior: é a lei do mais forte. Se o ser mais elevado é um
espírito bom (isto é, um anjo) o acordo se faz para o bem; se, ao contrário, o
ser mais elevado é um espírito maligno, o acordo não pode fazer-se senão para o
mal. Pois o demônio, espírito pervertido, não visa senão o mal. Como todo
contrato, cada parte procura atender aos seus interesses. Se, de um lado, o
espírito maligno aceita o acordo unicamente para o mal, a outra parte, o homem,
poderá exigir que esse mal lhe traga alguma vantagem, ao menos subjetiva:
dinheiro, honras, vingança, prazer; do contrário, não haverá razão para haver
acordo. Por sua inteligência e seu poder, os demônios são superiores aos
homens. Eles conhecem os segredos da natureza e os agentes físicos bem melhor
que os sábios jamais chegarão a conhecer. Eles são capazes de produzir
resultados surpreendentes e mesmo, quando isso serve a seus pérfidos desígnios,
obter vantagens materiais que recorrem a eles.
Como é evidente, o homem não tem poder sobre os
demônios e estes não são obrigados a atender aos desejos do homem, não o faz
porque esteja a isso obrigado; seja forçado a isso pelo homem, mas sim porque
satisfaz à sua soberba ver-se solicitado pelo homem, e até venerado por ele, em
lugar de Deus; de outro lado, atendendo a esses pedidos, ele pratica o mal,
quer em relação a terceiros, como se dá com freqüência, quer em relação ao
próprio solicitante, cuja alma conduz à perdição, que é o que ele tem em vista
ao aceitar o pacto.
Espécies
de pacto: explícito e implícito
É certo que pode haver, que houve e ainda há pactos
com o demônio.
1º Pacto explícito
O pacto com o demônio consiste num acordo entre uma
pessoa e o demônio, pelo qual essa pessoa se obriga a algo em relação ao
demônio, em troca da ajuda deste para conseguir aquela vantagem que deseja.
Muitas vezes o pacto é feito por escrito, e o demônio exige que o homem o
assine com o próprio sangue. Para estabelecer o pacto não é necessário que as
duas partes estejam presentes pessoalmente: elas podem atuar por meio de
procuradores. O demônio quase sempre é representado pelo feiticeiro,
pai-de-santo, médium etc. E isto já nos encaminha para o estudo da feitiçaria,
da magia, da macumba, que será feito a seguir.
Outras vezes o pacto se faz por meio de sociedades
secretas iniciáticas e com certas formalidades ou ritos estabelecidos. Por fim,
há ocasiões em que o pacto se faz com a aparição real do demônio. Há casos de
feiticeiros que têm um comércio habitual com o Espírito das trevas, o qual vêem
sob as mais variadas formas: humana, animal, fantástica.
2º Pacto implícito
Mas, ao lado do pacto explícito, há o pacto
implícito com o demônio.
É fácil, sobretudo para os cristãos, compreender que
um pacto formal, um recurso explícito ao demônio é contrário à lei de Deus. Mas
o recurso implícito, mediante práticas supersticiosas nem sempre aparece
claramente como um recurso ao Maligno e choca menos o senso moral.
Para que se possa dizer que há pacto implícito com o
demônio é preciso, bem entendido, que se tenha uma esperança mais ou menos
firme de que o efeito pretendido realmente será obtido; também é preciso que se
trate de práticas feitas com seriedade e não por mera brincadeira (embora seja
muito perigoso brincar nessa matéria, pois o demônio pode tomar a coisa a
sério). Como esse efeito não pode ser esperado dos meios empregados (que
evidentemente não são aptos para conduzir a esse resultado), ao menos implicitamente,
se crê na presença de certas forças misteriosas, extra-naturais, para obter
aquele resultado. Que forças são essas? Se não vêm de Deus (seja diretamente ou
indiretamente, através dos seus anjos ou da Igreja), de onde procederão?
A resposta não pode ser outra: vêm do Maligno.
Em muitos casos o homem se dá conta disso; porém,
cego por suas paixões desregradas, já não cogita de averiguar a origem do
resultado obtido: o que lhe interessa é alcançá-lo. Assim, vai-se acostumando
aos poucos a ver o demônio não como o espírito do mal, que ele é, mas apenas
corno urna ser poderoso, que ele pode utilizar em seu proveito; como uma
espécie de divindade conivente com suas paixões, a quem convém cultuar.
A superstição, em qualquer de suas formas, por
conter sempre um recurso claro ou velado, explícito ou implícito ao demônio,
constitui um pecado gravíssimo, contra a virtude da religião, que nos prescreve
prestar culto somente a Deus, e só a Ele recorrer e nunca ao poder das trevas —
"Adorarás ao Senhor teu Deus, e só a Ele servirás" (Lc 4,8).
Adoração
do demônio: sacrifícios humanos
Culto
idolátrico do espírito das trevas
A credulidade indisciplinada, soltando o freio da
fantasia no campo duplamente misterioso das forças sobre-humanas e
do mal, adultera o conceito de Satanás — inimigo de Deus e dos justos, porém
mera criatura limitada — para fazer dele uma espécie de divindade malfazeja, a
que se deve servir e agradar no interesse pessoal. De onde, alguns ritos, como
na macumba, umbanda e candomblé, se fazerem ofertas de alimentos e sacrifícios
de animais para aplacar o diabo e tomá-lo propício a quem recorre a ele. Essa
postura pode levar, e muitas vezes leva, o supersticioso a fazer uma autêntica
substituição de Deus pelo demônio e a realizar paródias blasfemas do culto
divino como nas Missas negras. Chega-se então ao satanismo pleno, que se
caracteriza pela vontade de praticar o mal, pelo ódio ativo, em nome da
liberdade absoluta, que investe contra toda lei religiosa e moral. Esse ódio
não é explicável pela psicologia humana, participando do mistério do mal, do
“mistério da iniquidade", de que fala São Paulo (cf. 2 Tes 2, 7).
E assim se passa do pacto implícito ao pacto
explícito com o demônio, e se chega ao culto idolátrico do espírito das trevas,
invocado às vezes sob nomes bárbaros como orixás, xangôs, exús e outros,
sobretudo nos ritos da macumba, da umbanda, do candomblé, e nas práticas de
magia em geral.
O
sacrifício: ato de culto de adoração
De acordo com a doutrina católica, só se pode
oferecer sacrifícios a Deus, por se tratar de ato essencial do culto de
adoração, pelo qual reconhecemos o poder absoluto que o Criador tem sobre nós.
Todo sacrifício oferecido a outrem que não a Deus reveste-se de um caráter
idolátrico, pecado gravíssimo de lesa-majestade divina. O sacrifício consiste
no oferecimento e na imolação de uma vítima (sacrifício propriamente dito) ou
no oferecimento e entrega de um bem em honra da divindade (sacrifício impropriamente
dito), com a finalidade de proclamar que Deus é o Senhor de todas as coisas e
que nós não ternos nada de próprio, mas tudo pertence a Ele.
Por causa do pecado, nós mesmos é que deveríamos ser
imolados a Deus; mas o Criador não permite a imolação cruenta do próprio homem,
corno faziam as religiões pagãs (cf. Lev 18, 21; 20, 1-5; Deut 12, 31; 18,
9ss).* Assim, não pode haver um sacrifício de imolação cruenta de seres
humanos. Não podendo fazer a imolação de nossa vida a Deus, imolamos nossa
vontade, que é no que consiste o sacrifício interno. O sacrifício externo
consiste no ato de oferecimento de uma vítima ou de uma coisa a Deus, e deve
ser apenas um sinal do sacrifício interno, do oferecimento de nós mesmos.
*Quando alguns judeus, no Antigo Testamento,
por imitação dos povos pagãos vizinhos imolaram vítimas humanas (cf. 1 Reis
16,34), Deus, por meio dos Profetas proferiu severas condenações a esses atos
(cf. Jos 6, 26; SI 105, 37ss; Miq 6, 7; Jer 7, 31; 19,5; 32, 35; Ez 16, 2Oss;
20, 26).
Sacrifícios
humanos
O demônio, em sua soberba demencial, quer se pôr no
lugar de Deus e ser adorado: “Tudo isto eu te darei se, prostrado, me
adorares" (Jo 6, 9), ousou ele dizer ao próprio Salvador, oferecendo-lhe
os reinos deste mundo E este é o convite que ele faz aos homens, sobretudo aos
que o procuram: “Adorem-me que eu lhes darei tudo!"
"Homicida desde o princípio" como o
caracterizou Nosso Senhor (Jo 8, 44), o demônio não se satisfaz apenas com as
oferendas de animais, alimentos, velas, cachaça, etc., segundo se pratica
correntemente nos cultos de macumba. Sempre que pode, ele exige sacrifícios
humanos. Isto não é algo que se tenha dado apenas na Antiguidade, ou entre os
povos bárbaros, mas ocorre ainda em nossos dias. E entre nós, conforme veremos
adiante.
(Fonte:
internet. Autoria:“Anjos e Demônios - A Luta Contra o Poder das Trevas”,
Gustavo Antônio Solímeo - Luiz Sérgio Solímeo)
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